Otília
"era este o nosso banco, mãe...Eu, tu e o Gonçalo...pequenino e eu também pequenina. Recem mãe mas pequenina. Ao pé do teu saber, da tua vivência. E o quanto nos irrita quando a nossa mãe adianta saberes, soluções, sugestões...E eu pequenina, mãe...Depois cresci imenso, tive que crescer tanto, mãe, com a tua partida. Morreste-me. Eu podia ter morrido contigo...Qualquer coisa em mim morreu contigo ou ficou irremediavelmente perdida.
Agora sou uma mulher crescida. Dou comigo a olhar-me no espelho e a ver a tua cara. Lembro-me dos teus olhos, pequenos, muito escuros profundos...que pintavas com um risco preto. Bérbére. Eu ainda não me pinto. Mas já tiro os pelos debaixo dos braços! Cresci muito...
Por vezes dou comigo a sentir que a adolescência está a ir-se embora...E digo coisas como "Estou velha...É a velhice..." Esperando que alguém me diga: "que disparate". E ouço cada vez menos essa resposta esperada. Ficam-me olhando. Sentindo que o que eu digo pode ter a sua razão. E logo quando eu esperava que não tivesse razão aquilo que eu digo.
Vejo aqui ao meu lado o carrinho do bebé. E ele a sorrir para nós. Pegaste-lhe ao colo...e confessaste que nunca tiveste muito jeito para pegar os bebés pequeninos...Que o pai é que sim. Ele é que nos dava banho porque éramos muito pequeninas...Tu esperavas que crescêssemos...para nos aconchegares no teu colo imenso e sábio. Sentada nesse teu colo, na cozinha. Quantos namorados tenho? 13...lembras-te mãe? Foi essa filha que sempre aconchegaste...Quando me davas a entender que tudo era possível, que o importante era o amor e a alegria...Viver...e tu morreste-me, mãe...
Foi tudo neste banco, mãe...Pouco tempo depois ficaste irreversivelmente doente. Depois morreste-me. Sem termos voltado a este banco, as duas, os três...Volto aqui tantas vezes sozinha...para ver se te sinto..."
Escrito em Outubro de 2009, num banco da Alameda em Faro.
Este encontro, este grito...é um pouco para ti, Pitucho. Com um abraço do tamanho do Mundo, sabendo que nada há a dizer nestas coisas do Amor e da Morte... Senão recordar, trazer, fazer jus da Beleza. Encontrei neste escrito uma forma de partilhar com a mixta a minha perda, a tua perda...Desculpa por isso...
Hoje é dia da Prima Vera! Os botões das flores estão inchados a abrir, a natureza começa a despontar aqui e além, as cores do fim da tarde são diferentes...o renascer, a renovação, o recomeço. Usando sobre isso "uma frase batida: Hoje é o primeiro dia do resto da tua vida"...
m.
5 comentários:
Como sempre, fico "engasgada" e sem palavras perante sentimentos destes!Sem hipocrisias e apesar de estar longe de saber o que é o vosso sentimento de perca, fico sempre com um nó na garganta! Por amizade! Por carinho ou apenas por egoísmo, por sentir que as vossas tristezas, as vossas percas,as vossas dores me fazem também sentir que o "NOSSO" mundo já não é tão colorido tal como nós há uns anitos atrás desejaríamos e pensávamos que fosse, eternamente!Mas não! Nada é eterno! Por isso Meguy, tu que ensinas essas coisas GRITA bem ALTO (para que eu te oiça)que HOJE é importante!!!! Muito Importante! porque amanhã o hoje já não existe e se calhar perdeste alguma coisa boa que não te devia ter escapado! Diz BEM ALTO, Meguy para ver se eu me convenço também disso!!
ainda tenho os meus Pais vivos, nos seus oitenta e muitos anos. Temo o dia em que eles desapareçam, para sempre. Já vivi de perto a morte e o vazio que fica depois. Já vi parti os meus sogros, tios, amigos, pessoas de quem muito gostava e que se foram embora para sempre. Os meus pais ainda os tenho e cada vez mais sinto que tenho que me gozar da sua companhia e do seu carinho, porque de um momento para o outro eles podem deixar de estar ao pé de mim...e eu temo muito esse dia.
um bjnh enorme para ti e obrigada por partilhares connosco a tua perda
Um beijo enorme Pituxo. Acredita que agora há mais uma estrelinha, muito brilhante no céu.
Um bjnh ao Pituxo.
um abraço atrasado (?) pituxo. a roda da vida dá mais uma volta e ficamos nós na linha da frente... conheço a sensação.
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